Série CHECK in-out 28 - Virtualidade - Uma liderança distribuída.
- DOIS Marketing Online
- 19 de ago. de 2024
- 9 min de leitura
Atualizado: 20 de out. de 2024
“Não temos um líder, nem damos esse título a alguém. A função se desloca, dependendo do estágio em que estamos.”
Isso significa “Virtualidade” gerenciar pessoas que você não pode ver nem controlar de perto em todos os aspectos. Esse tipo de liderança por controle remoto só pode funcionar quando o crédito/credibilidade existem em ambas as direções, com alto grau responsabilidade e maturidade em autoridade e autonomia. Precisa ser conquistada, testada e se necessário subtraída.
Estatisticamente era observado que as comunidades se estabeleciam em configurações de não mais de 50 pessoas com relação às exigências de confiança. Com o passar do tempo essas mesmas empresas estão reduzindo significativamente esse número e começando a se reagrupar em forças-tarefa semipermanentes, onde os membros conhecem-se e compreendem-se uns aos outros.
A liderança desses grupos não é do estilo ultrapassado do tipo “sigam-me”. Você pode chamá-la de liderança distribuída.
Tive a oportunidade de observar esse modelo funcionando em um campeonato de remo que fui assistir. Todos nós sabemos como funciona, tem que remar para chegar primeiro. Mas quando começamos a prestar mais atenção aos detalhes e com o olhar comparativo sobre o aspecto da liderança, começamos a enxergar elementos que são sutis e despercebidos para muitos que estão de fora. Me chamou a atenção que são oito pessoas - andando para trás o mais rápido possível - sem conversarem, guiadas pela única, que não pode remar.
No máximo seguindo a batida dos remos e um som cadenciado como se fosse um mantra.
Estranho né?
Nem tanto!!!
Os antigos navegadores usam essa mesma técnica para levar suas embarcações para o outro lado do mundo, cadenciando tambores e em casos extremos com a ajuda de uma delicada ferramenta chamada chicote.
Como você acha que poderiam andar para trás sem se comunicar e cada vez mais rápido se não pudessem confiar totalmente na competência de cada um, se não estivessem compromissados com a mesma meta e determinados a fazer o melhor para alcançá-la.
Essa pode ser a descrição perfeita para um trabalho em conjunto.
Então nesse modelo quem é o líder?
Depende! Como ninguém manda em ninguém, na competição é adotado que a liderança será conduzida pela pessoa que está na ponta, aquela que não pode remar. Sempre é a menor pessoa e mais leve. Mas existe também o remador de popa, aquele que estabelece o ritmo e o padrão a serem seguidos. Fora da água, o líder é o capitão. Ele ou ela é o responsável pela escolha da equipe que irá competir, seja pela disciplina, pelo ânimo e motivação. Já na água o capitão é apenas um membro da remada. Ainda tem o instrutor ou treinador, responsável pelo desenvolvimento da equipe. Não há nenhuma dúvida em quem lidera na hora que o instrutor está por perto.
Temos que admitir, esse modelo funciona!!!
Me fez lembrar um dos meus primeiros trabalhos, eu era muito jovem, tinha quase 19 anos completos.
Me deparei na escada do prédio com Rodrigo meu vizinho. Ele estava chegando de viagem. Seu trabalho fazia muitas vezes que ele ficasse fora quase o mês inteiro, então sua esposa e filhos que eram pequenos naquela época recebiam doses homeopáticas do convívio com o pai e marido. A grande maioria dos profissionais que dependem de viajar para exercer seu trabalho, sabe bem o que é isso e o desgaste que isso causa.
Gostávamos de conversar quando ele estava presente, era um cara mais velho, alegre, brincalhão, todos no prédio gostavam muito dele. Nesse dia em especial conversamos sério, ele veio me abordar querendo saber o que eu fazia. Disse que estava cursando administração e que trabalhava em uma empresa de navegação como auxiliar de escritório – foi meu primeiro emprego de carteira assinada e esse era o registro nela com muito orgulho - mas na verdade fazia-se de tudo o tempo todo, de ir a bordo de navio, receber os pedidos pelo telex, fazer cotações, emitir notas fiscais, pegar nas agências marítimas as assinaturas das guias, CASEX no Banco do Brasil para liberação das guias para embarque, checava os produtos separados, verificava o embarque nos caminhões, as vezes até dirigir os caminhões era preciso para manobras ou até ir rebocar um que fiou atolado num domingo de chuva tentando chegar ao porto de Ubú.
Era um trabalho muito dinâmico e divertido. Todos os dias era um acontecimento novo, um novo desafio, pessoas maravilhosas que pude conviver e compartilhar dois ótimos anos de minha carreira – uma escola que não se aprende nas faculdades. Tempos bons de crescimento e aprendizagem.
Um detalhe, trabalhávamos 7 dias por semana, 365 dias por ano, sem horário. Navio não tem noite ou dia, chuva ou sol, chegou tem que ser atendido, de manhã, de tarde ou de madrugada. No máximo revezávamos entre nós momentos de folga do tipo... ”posso tirar o sábado que vem à tarde porque vai ser aniversário do meu pai...” e alguém cobria a lacuna.
Outro detalhe, todos estavam à disposição e disponíveis e ninguém carregava o sentimento de que era uma exploração ou de que éramos usados ou coisa parecida. Aprendi ali naquele ringue que temos sim que adotar um senso de responsabilidade e envolvimento com o resultado. Senso esse que trago até hoje na minha profissão e vida.
Me fez lembrar de um fato em que não deu certo. Tudo que tinha que dar errado, deu. Todos nós ficamos com um sentimento de que a culpa era nossa e não de fulano ou beltrano ou da empresa. Para aquele grupo era uma responsabilidade coletiva de impacto para todos. E me lembro também de que, todos se emprenharam muito e muitas horas de dedicação para reverter o problema.
Lembrei também que nesse negócio, aos seis meses de casa, recebi as chaves da empresa que me foi jogada no peito – literalmente - pelo meu gerente, que disse “moleque, estou indo pra casa, você tem meu telefone de casa, me liga só se precisar. Se tiver algum problema, se vira, resolva.”
Aos dezoito e meio, estava no “comando” de uma empresa de mais de cinco milhões de faturamento mês. Com profissionais de doze anos de casa e com uma experiência infinitamente maior que a minha. A minha, era zero como líder.
Lembra do conceito de liderança distribuída?
Foi exatamente o que aconteceu. Cada um dos membros da equipe sabia exatamente o que fazer e o momento de assumir sua posição de liderança. Um ajudando o outro a dar certo. E quando o assunto era comigo a liderança era toda minha (o mesmo com o treinador do remo).
Hoje é muito comum ver profissionais reclamando por que estão sobrecarregados, estressados, não agüentam mais...não gosto disso, não quero aquilo... Como dizem, muito mimimi... rsss.
Assim deveria ocorrer em todas as organizações nas camadas intermediárias. Uma distribuição da liderança por responsabilização.
No topo da organização, entretanto, tem que ser muito diferente. Nesse caso, a liderança precisa ser personalizada, pois a tarefa nesse nível é providenciar a cola suave que manterá unida esta comunidade virtual. A cola é feita de um senso de identidade comum, ligada a um objetivo comum e alimentada por uma energia e uma urgência contagiosa. Simples palavras não fazem essa cola. – ela precisa ser vivida. Esta energia contagiosa deve começar com um indivíduo ou, em algumas situações e raramente, com um pequeno grupo central que viva suas crenças. Acredito que essa foi a experiência que vivi na navegação. Todos estavam vivendo uma crença de que era um por todos e todos por um.
As palavras utilizadas pelos líderes dessa alta hierarquia são sintomáticas. Alguns exemplos: “Sou um missionário. Percorro o mundo sem parar, explicando para as pessoas o que fazemos e por que fazemos”. “Sou um professor. Meu trabalho é educar e fornecer as perspectivas necessárias para realizarem seus trabalhos sem instruções superiores. “Preciso viver de acordo com o que eu digo que sou. Se não sigo o que prego, não posso esperar que o façam.”
Não sei se você já passou por isso. A falta de atributos imprescindíveis para exercer sua liderança.
É árdua a tarefa de conduzir uma comunidade em que a autoridade precisa ser conquistada. São muitas as exigências para se ter sucesso nesse quesito e nem todos conseguem.
É uma combinação incomum de atributos que na dose certa potencializam os efeitos nos resultados sobre as pessoas. Na dose errada é quase impossível recuperar a autoridade. Uma vez quebrada, vai ter sempre um trincado mesmo depois de colado.
Somente a crença em si mesmo proporciona ao indivíduo a autoconfiança para caminhar em direção ao desconhecido e persuadir outros a irem aonde ninguém esteve antes.
Combinada com uma dúvida razoável, a humildade para reconhecer que está errado, que outros também têm suas próprias ideias e que ouvir é tão importante quanto falar, fará toda a diferença.
A paixão pelo trabalho proporciona a energia propulsora e o foco que orienta a organização atua como exemplo indutor para os demais.
Combinado com o seu oposto, de ser capaz de abranger uma área maior e ampliar sua visada para não ofuscar a capacidade de pensar fora da caixa e restringir seu próprio espaço. Grandes líderes encontram tempo para ler, ir ao teatro, cinema, conversar com outras pessoas fora do seu círculo, caminhar por outras terras além mar.
O líder precisa ter amor pelas pessoas. Numa comunidade aqueles que causam dor, sofrimento a aborrecimento podem ser respeitados ou temidos, mas não serão seguidos de bom grado. Esse atributo também requer seu oposto, a capacidade para a solidão. Tendo em vista a posição de liderança, nem sempre é possível compartilhar tudo que sabe e sente com mais alguém. Em muitos casos nem com seus próprios pares. Poucos agradecerão ao líder pelo que der certo, mas muitos o condenarão quando os resultados forem negativos.
Grandes líderes têm seus momentos a sós de reflexão e sabem dar o reconhecimento aos outros que muitas vezes lhes é negado.
Conviver com esses paradoxos requer grande força de caráter. Requer uma crença no que se faz. Dinheiro nenhum será o suficiente para proporcionar a razão de viver com estas contradições. Mesmo o amor pelo poder não é o bastante para sustentar, pois acaba por eliminar as contradições em vez de equilibrá-las.
Isso é histórico, grandes líderes se originam de grandes causas.
A falta dessa causa gera quase sempre uma crise. Enquanto a empresa e pessoas não abraçarem uma causa maior e mais abrangente, tendo só o enriquecimento dos acionistas, teremos poucos líderes de peso. É mais provável encontrá-los na arena das organizações sem fins lucrativos. Se esse for o caso, tal setor ainda poderá vir a ser o local de treinamento para lideranças empresariais.
Toda geração se rebela não apenas contra determinados líderes, mas também contra o próprio estilo de liderar por eles adotados. A idéia que as pessoas têm sobre liderança se reflete nos valores e as preocupações mais gerais de cada época e de cada um.
Na atualidade passamos por um período transitório de uma necessidade de liberdade de expressão, sem restrições, cobranças e responsabilidade sobre o resultado. Em contra partida o modelo atual da maioria dos negócios ainda são conservadores e exigentes quanto a respostas positivas.
O estilo patriarcal de liderar que levou pessoas, predominantemente do sexo masculino a comandar as grandes organizações industriais no pós-guerra, atravessou o período da guerra fria e permanecem até hoje como modelo e exemplo para os que surgem a cada dia... Seja no universo acadêmico ou nas ruas: Toyota, VW, Disney, GE, Honda... Seguimos aprendendo com eles como ser perenes.
Tendo como referencia essa mesma época, um executivo de estilo militar não apenas predominava - naquela época - como também era apropriado a ela.
É evidente que tal modelo não é tão adequado hoje – sabemos que esse modelo militar para alguns negócios ainda funcionam – embora o porquê não seja tão óbvio como se possa imaginar. No novo tempo talvez esteja ligado a “feminização” do local de trabalho, liberdade de gestão compartilhada, tecnologias disponíveis, globalização, o empoderamento de jovens no exercício de liderança entre outros possíveis fatores.
Houve uma época em que as metáforas sobre liderança baseavam-se na fisiologia, onde o líder era a cabeça e o corpo era a organização. Hoje tais comparações contrariam a natureza fisiológica do corpo. A sabedoria deve ser distribuída por todo o sistema, não somente na cabeça. No caso das organizações levando-se em conta que na liderança distribuída, todas as células devem ser fortes o suficiente para resistir a qualquer corpo estranho.
Na minha opinião, temos três características que assinalam o modo como hoje obtemos cada vez mais a realização de um trabalho e juntas essas características moldam o tipo de liderança requerida.
- Trabalhamos em mercados, organizações e sociedade que mudam com muita velocidade e constância.
- Seja qual for nossa atividade ou profissão, gastamos muito mais tempo manipulando informações sobre determinados assuntos do que tratando do assunto em si.
- A produção e as atividades de apoio de uma empresa, que eram todas realizadas internamente, estão agora cada vez mais desempacotadas e distribuídas entre diferentes organizações que complementam o trabalho.
Então ser líder em um processo tão complexo requer que estejamos atentos não somente para olhar para nosso interior, mas repensar o redesenho que está sendo moldado agora, lá fora por circunstâncias das necessidades e expectativas dos diversos negócios que fazem fronteira com o negócio que estamos inseridos.
É preciso ser líder para todos os negócios ligados a mim. Isso é tão verdade que é cada vez mais comum que uma empresa determine as regras de funcionamento de outra para que ela permaneça como fornecedora regular.
Quando falei do Rodrigo, ele me fez recordar o que relatei aqui. Mas na verdade naquele dia, naquela conversa séria, começou outra história... Mas essa é para um outro momento!
Sua participação:
-Quantas pessoas você conhece bem o bastante e a tempo suficiente para nelas confiar e merecer o crédito para liderá-las?
-O que você pode fazer para inspirar confiança nos outros?
De Mário Borgo – Com base em pesquisas e estudos sobre liderança. Richard Beckhard – Joseph O’Connor – John Seymour
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